quarta-feira, 27 de novembro de 2013

Impossível roubar bebê

Impossível roubar bebê
Para Entender Direito - Blog

Saiu na Folha de hoje (27/11/13):

"Bebê doado a casal volta para casa do pai em BH
Presa, mãe teria oferecido filho em site e disse que criança foi roubada
Um bebê de dois meses que teria sido entregue pela mãe a um casal de adolescentes do Rio voltou com o pai a Belo Horizonte na noite de anteontem. A mulher foi presa e, segundo a polícia, confessou ter mentido ao dizer que o filho havia sido roubado (…)
Após novos depoimentos, policiais desconfiaram da versão. Ontem, após receber a informação de que a criança havia sido vista no Rio, a polícia localizou o bebê com um casal de adolescentes de 17 anos.
A garota teria confessado que recebeu o bebê no sábado, em Belo Horizonte (…)
A mãe deverá responder por falsa comunicação de crime e subtração de criança para colocar em família substituta. A pena prevista é de dois a seis anos de reclusão.
"

A linha fina e o primeiro parágrafo da reportagem falam em roubo da criança. Já o último parágrafo diz que a mãe será indiciada por subtração de criança para colocar em família substituta, e não menciona roubo.

Para o leigo, a palavra roubo parece significar subtrair alguma coisa de maneira grave. Quando bandidos levaram cerca de R$160 de milhões do cofre do Banco Central em Fortaleza em 2005, por exemplo, os jornais noticiaram o crime como roubo do Banco Central. No caso acima a maior parte dos jornalistas cometeu o mesmo erro e chamou de roubo. Em ambos os casos, a palavra 'roubo' foi usada incrretamente para dar a ideia de gravidade do crime. Mas essa licença poética pode ter complicações graves no mundo jurídico.

O fato é que roubo ocorre apenas quando se subtrai coisa alheia móvel com violência ou grave ameaça.

O valor da coisa não importa. No caso do Banco Central, por exemplo, era furto porque embora o valor fosse alto, não houve violência nem grave ameaça. Os ladrões entraram e saíram por um túnel, sem serem notados. Logo, era impossível haver violência ou grave ameaça. Por isso foi furto. A quantidade furtada aumenta a quantidade de pena, mas não muda o crime.

No caso da reportagem acima, a criança não é uma 'coisa', ou seja, não é objeto. Ainda que seja um bebê com poucas horas, dias ou meses de vida, a criança não é um objeto. O mesmo ocorre com alguém em coma ou que sofrem de distúrbios mentais. O fato de alguém não conseguir expressar sua vontade não o transforma de pessoa em objeto. Logo é impossível que a criança da reportagem acima tenha sido roubada. Por isso a mãe responderá pela subtração de criança, com dito no último parágrafo.

Ademais, não é qualquer coisa que pode ser roubada. Precisa ser coisa alheia e móvel.

Você não pode roubar aquilo que é seu. Se você desaparece com sua televisão e chama a polícia, você não pode ser processado por roubo (mas será processado por falsa comunicação de crime – assim como a mãe da matéria acima – porque fez, propositalmente, a polícia perder tempo investigando um crime que não aconteceu).

E a coisa precisa ser móvel. Daí ser impossível roubar uma casa (exceto se ela vier com rodinha). O que se rouba são os bens que estão dentro da casa porque, esses sim, são coisas móveis.



Original Article: http://direito.folha.uol.com.br/1/post/2013/11/impossvel-roubar-beb.html

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