Nelson Motta, O Globo
Andy Warhol dizia que gostava de fofoca pelo seu duplo valor de informar tanto sobre a pessoa que está sendo falada quanto sobre a que está falando, porque ninguém se contenta em contar a novidade sem comentá-la e julgá-la, revelando seus gostos e sentimentos.
Nos tempos de Andy, a fofoca era chamada brejeiramente de mexerico e corria de boca em boca ou por precárias comunicações, de fontes restritas e duvidosas, mas hoje se propaga instantânea e incontrolavelmente, usando a sua origem como prova de sua veracidade: está na internet!
O ancestral "diz-me com quem andas e te direi quem és", ainda atualíssimo para a avaliação de políticos, hoje é aplicado aos sites, blogs, twitters e seriados para monitorar o que segues e saber como és. No formato "diz-me do que gostas e não gostas", serve não só para dizer quem és, mas até o que queres, antecipando os teus desejos baseado no que já compraste, e assim facilitando tuas escolhas — de mais do mesmo.
A linguagem proverbial é antiga, mas o moderno poder de se informar e de comprar o que quiser e escolher em que fontes beber na rede vai permitir que as tuas escolhas revelem quem és e como vives. Principalmente para te venderem o que não precisas. Diante do que vivemos hoje a temida monitoração onipresente do Big Brother de "1984" parece coisa de adolescente, no máximo, de programa de televisão.
Em ano eleitoral a produção e a disseminação de fofocas vão atingir os seus níveis mais altos, e mais baixos, com os piores objetivos, e até sem motivos claros ou uniformes, como nos protestos de junho.
Com os dados cada vez mais detalhados e ampliados de que dispõe sobre o eleitorado, o marketing das campanhas vai vender seus produtos e tentar motivar os consumidores fiéis e atrair os insatisfeitos, com o empobrecimento do debate político e do confronto de ideias.
Só espero que os políticos de todos os partidos não continuem a dizer na televisão que "ouviram a voz das ruas", porque foi justamente contra eles, seus privilégios, sua corrupção, sua ineficiência e impunidade que as ruas e as redes gritaram. E vão gritar nas urnas.
Nelson Motta é jornalista.
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